Carta 021 - O que é o futebol (ou o que poderia ser)

Querido Joaquim,

Na cartinha de hoje, quero registrar em texto sua primeira foto como torcedor de um time de futebol. Tradicionalmente, um filho começa a gostar do esporte por influência do pai ou do avô. Da mãe e avó também, é claro, mas com menos frequência. Há, inclusive, aqueles que se sentem influenciados por tios e padrinhos (o meu caso) e outros que não suportam acompanhar a um minuto sequer de uma partida.

Não sabemos exatamente quais esportes você vai gostar mais, quais instrumentos vai achar mais bonitos de ouvir e quais caminhos decidirá percorrer quando sua independência der as caras. Enquanto isso, nós seguimos tentando te apresentar todas as coisas possíveis, para que você tenha lembranças de experiência para decidir, no futuro, suas predileções.

Na última semana, seu pai colocou em você uma camiseta do Corinthians, um time de São Paulo com mais de 100 anos! Talvez, ao lado do Flamengo, o time de maior torcida do Brasil. Certamente, o clube mais popular do país! Não há um jogador tido como ídolo maior, mas alguns atletas postulam esse cargo com merecimento. (Cássio? Marcelinho? Neto? Sócrates?)

No ano em que você nasceu, Joaquim, o Corinthians não estava lá em sua melhor fase. No futebol brasileiro, isso é a coisa mais normal do mundo! Times crescem e diminuem ano a ano, ganham e perdem campeonatos, caem de divisão, e novos jogadores surgem para elevar ou subtrair algo do time.

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Ah, preciso te contar uma coisa sobre mim: você acredita que eu comecei minha vida torcendo para o Palmeiras? Anos depois, mudei de lado e virei santista por influência do meu tio Tarcísio, que me apresentou ao time da Vila. Coisa de criança, você sabe.

Apesar de, hoje, torcer para um time rival, nutro um carinho enorme pelo Corinthians. Não pelas vitórias, títulos ou ídolos, mas pelo que o clube representa politicamente. Quando você for grande, vai gostar muito de ler sobre a "Democracia Corinthiana", um movimento bonito e necessário que, nos anos 80, transformou um vestiário em trincheira e fez do futebol um espaço de liberdade, voz e resistência. É impossível não admirar um time que ajudou a escrever um capítulo tão luminoso da nossa história.

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Financeiramente, Joaquim, é um esporte riquíssimo! É bom acompanhá-lo como torcedor, mas é sempre preciso um pé atrás (ou os dois!), pois trata-se de um negócio. Times são empresas, hoje em dia e, mais do que a nossa paixão, o que eles buscam, fora dos gramados, tem nome: grana. 

Ainda assim, por trás dessa engrenagem que gira milhões, existe algo que dinheiro nenhum compra: o encanto. É aí, Joaquim, que mora a magia. Talvez você cresça e descubra que o futebol não é exatamente o seu porto. Talvez prefira o silêncio da leitura, a vibração dos sons, o cheiro da tinta nas artes, as bicicletas, ou alguma paixão que ainda nem conhecemos. 

O que importa — e isso eu queria deixar escrito nesta carta — é que essa sua primeira camisa não é um rótulo, mas um registro de afeto. Um gesto do seu pai sugerindo: “vem comigo descobrir o que faz os meus olhos brilharem”. E, se um dia você decidir trocar de time (talvez o Cruzeiro, time da sua mãe e do vovô João), até de esporte ou de sonho, tudo bem! 

O bonito da vida é justamente essa capacidade de mudar — ou permanecer — com inteira liberdade. Buscando o que faz você se sentir melhor!

 Porque, no fim das contas, viver é exatamente isso: aprender que nem todo dia é clássico, que alguns placares nos surpreendem, e que o mais importante é ter um time na arquibancada da vida. O nosso time. A sua família. Sempre ali, de pé, cantando o seu nome, aconteça o que acontecer.

Por enquanto, nosso jogo continua empatado. É amor para todos os lados.


Com carinho,
Tio/Padrinho Matheus.
23 nov. 25