Carta 004 - A voz dos seus avós

Querido Joaquim,

Você sabia? Ontem, dia 26 de julho, foi comemorado — no Brasil e em Portugal — o Dia dos Avós. Uma data doce que nos faz lembrar sempre daqueles e daquelas que embalam o tempo e contam histórias entre um capítulo da novela das seis e um bolinho servido com um cafezinho no final de uma tarde de domingo.

O Dia dos Avós tem dois homenageados: Santa Ana e São Joaquim, pais de Maria e avós de Jesus, segundo a tradição católica. Joaquim e Ana, segundo uma breve pesquisa que fiz, viveram provavelmente na região da Galileia, onde hoje se localiza um país chamado Israel.

Joaquim, seu xará, tinha fama de ser um homem de coração generoso. Ana, por sua vez, era conhecida por sua profunda confiança em Deus. Ambos são lembrados há séculos como símbolos de paciência e esperança — que, aliás, também são características de todos os avós, não é verdade?

(...)

Tenho boas lembranças dos meus. Guardo deles o cheiro, as lições e o cuidado que sempre tiveram comigo e com os outros netos. A sabedoria deles, Joaquim, não está somente nas palavras, mas também nos gestos — como um bolo dividido de maneira igual para todos os netos, um conselho simples diante de uma adversidade complexa ou uma bênção dada sempre antes de sair ou chegar.

Com eles, Joaquim, entendi que há vários tempos: o de esperar, o de escutar e o de acolher. Como uma sementinha que insiste em crescer, quem dessa atitude se vale só prospera!

Você ainda é um bebê, mas um dia vai descobrir que, com a sua chegada, o mundo dos seus avós se transformou para sempre. Seu nascimento fez com que eles renascessem, e junto da nova missão que agora possuem, nasceram também novas formas de amar.

Dizem que eles vivem duas vezes: uma, quando nascem; outra, quando nascem os netos.

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Seu avô paterno, o vovô Toninho, não vê a hora de você poder brincar com a coleção de carrinhos que ele tem. Sempre que você nos liga por videochamada, ele corre para ver o seu rostinho na tela. Tem, como plano de fundo do celular, um vídeo lindo em que você está de roupinha amarela, simulando um aceno suave e delicado. Ele te chama, carinhosamente, de Joaquinzinho.

Sua avó paterna, a vovó Roseli, é quem mais te presenteou até aqui. Tudo o que ela vê lembra você! Sempre que ela te olha, tem evocadas em seu olhar as mais doces lembranças de quando podia carregar os filhos no colo. Ontem mesmo, confessou à sua mãe e a mim que sente muitas saudades de quando nós éramos bebês. Memórias e lembranças que só o amor puro pode explicar.

Seu avô materno, o vovô João, fica encantado com cada coisinha que você aprende a fazer. Assim como o vovô Toninho, já se acostumou com a sua ligação diária e com ouvir, com atenção, os sons que você já é capaz de emitir. Ah, você adora ser balançado por ele! Talvez sua serenidade, Joaquim, tenha nascido dele, em grande medida.

Sua avó materna, a vovó Inês, brincava, há muitos anos, que queria um menininho. E agora ela tem um: extremamente esperto e cativante! Sua mãe conta que a vovó Inês já sentenciou: você, Joaquim, pode ficar com ela o tempo que for, e que, se um dia estiver chovendo, não há com o que se preocupar. Você pode dormir com ela tranquilamente — sob o risco de, brincadeiras à parte, não ser mais devolvido aos seus pais.

(...)

Estou estudando, Joaquim - como parte de uma disciplina da faculdade - alguns autores portugueses. E, me preparando para uma prova que fiz no último sábado, encontrei um trecho muito bonito de José Saramago — talvez o principal autor de Portugal no último século — que, por coincidência, dedicou aos seus antepassados o maior prêmio literário que já recebeu.

Não é uma frase específica sobre avós, mas expressa bem o que neles reside enquanto essência. Avós, lembre-se sempre meu sobrinho, são bibliotecas humanas; são memórias ambulantes e baús de vida. Cada abraço que eles dão é um capítulo de um longo livro que deve ser contemplado devagar, quase parando.

Com essa frase de Saramago, gostaria de encerrar esta carta te lembrando que você tem avós que vivem o presente cientes de que você, sim, é o melhor dos presentes:

“Somos a memória que temos e a responsabilidade que assumimos. Sem memória não existimos; sem responsabilidade, talvez não mereçamos existir.”

Escrevo a você, Joaquim, com o carinho de quem sabe que a infância é um lugar onde os avós moram para sempre. Também com a satisfação de ver, nos teus olhos, o milagre do recomeço nascendo diariamente. Guarde esta carta com carinho junto de algumas fotos. Essas lembranças serão o fio que costurará o passado ao futuro — numa linha do tempo que nenhuma força será capaz de arrebentar.


Post scriptum é o nome que se dava a algo escrito depois de uma carta pronta. Como não fazia sentido reescrever um texto inteiro apenas para acrescentar uma nova informação, bastava escrever P.S. no final, como um sussurro carinhoso à margem do papel. Bom, aí vai o meu:

P.S.: Sua mãe me contou ontem mesmo, já no finalzinho do dia, que você deu a primeira gargalhada da sua breve vida — e que isso aconteceu nos braços da vovó Inês. Talvez seja assim que a vida sempre recomece: no riso de um bebê, no colo de uma avó, e no instante em que o tempo para — só para ouvir.

Com carinho,
Tio Matheus,
27 jul. 25