Carta 003 - A vida é uma estrada onde o que importa é a paisagem
Querido sobrinho,
Hoje prometo ser breve. Quero te contar das vezes em que encontramos respostas pelo caminho quando a gente nem procurando estava - e de como é bom quando isso acontece.
Comigo, tal fenômeno se manifesta quando leio algo que eu gosto, quando ouço alguma música que aprecio, quando tenho um papo com um bom amigo ou sempre que algo interessante surge espontaneamente no ar como um sapo que pula da lagoa para ver a luz do sol.
Esses dias, conversávamos com sua mãe sobre seu apego a ela, sobre como a olha quando está tomando banho, mamando ou fazendo qualquer outra atividade. Ao tentar encontrar respostas para explicar esse amor, falhamos - em alguns momentos, por não saber mesmo o motivo; em outros, simplificando com dizeres do senso comum como a frase clássica: "mãe é mãe, né?"
Eis que, na minha leitura diária, encontro o trecho:
"Quando nasce uma cria, há um planeta com seu nome onde só sua mãe habita."
Hey! E não é que alguém conseguiu dizer em palavras o que estávamos procurando como resposta? O dono do feito? Valter Hugo Mãe (olha o nome!), escritor português que seu tio aprendeu a amar nesse ano de 2025.
(...)
Diante de tantos trabalhos e afazeres nesta última semana, fiquei pensando no que escreveria pra você e, para minha surpresa, encontrei a música "Estrada Tortuosa", do amigo Jeff Marques, no meu aplicativo de música. Caramba, mais uma vez o acaso me dando o empurrão que eu precisava!
E ela não podia ter vindo em melhor hora, pois começa respondendo algumas de minhas angústias sobre o tempo:
"Penso que a gente não foi feito para viver, assim, correndo sem parar. O tempo passa mais depressa e cada vez parece mais passar toda vez que eu me atrevo a parar pra reparar os danos e relembrar os anos que passaram e eu nem percebi."
Que grata surpresa! Cá estou eu, Joaquim, com meus trinta anos e realizando o sonho de ter você ao meu lado e em nossos corações. Nem nos maiores sonhos eu podia pensar que isso seria tão legal! A resposta, meu sobrinho, estava soprando ao vento, do jeitinho que cantou o famoso americano.
(...)
Tenho um aplicativo no celular que me traz, diariamente, pinturas ou esculturas famosas mundo afora. E você nem imagina a tela que conheci hoje: "A Família Feliz", de Jan Steen, pintada no ano de 1668! Que coincidência! Era a imagem que eu precisava para escrever esse texto.
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Somos o seu espelho, Joaquim. E isso é uma responsabilidade gigante que a gente ainda está aprendendo a lidar.
Preocupado com o que eu poderia ensinar a você, fui atrás de um livro que pudesse me falar mais sobre esse desafio. E não é que encontrei um ótimo título logo na primeira tentativa! "A contribuição dos tios e tias na vida dos sobrinhos", da pesquisadora Maria Madalena Lima e Silva. Nada poderia ser tão direto e preciso.
Sei que não vou aprender a ser um bom tio lendo somente esse livro, mas ele vai me dar boas pistas do que devo fazer daqui pra frente. Acho que aprendemos com um monte de coisa, Joaquim: livros, músicas, filmes, brincadeiras, aulas, observações... Por isso, esteja atento sempre ao que acontece ao seu lado! Mais do que um imperativo de vida, reparar o que está em volta da gente nos faz não reclamar da sede com os pés debaixo da água.
(...)
Puxa, prometi que ia ser breve, né? Seu tio, às vezes, fala demais. É a pressa que tenho em te mostrar que o que nos envolve, apesar de breve, já é eterno.