Feliz morrerás
Sempre curti o desenho animado "Coragem, o cão covarde". Mais do que o desenho, curto mesmo a brincadeira com o nome. Na real, um animal medroso não é lá um caso tão raro assim, mas um cão medroso que se chama Coragem, sim. Rabo correndo atrás do cachorro.
Me pergunto se o contrário funcionaria: "Covarde, o cão corajoso"? Nah, seria mais um desses filmes de super-heróis, né? Acho que curto mesmo a fragilidade exposta, a fraqueza nua, a vulnerabilidade. De força, segurança e aparências o mundo tá cheio!
Há um ponto interessante também: "Coragem" não é de todo um cão covarde. Ele se assusta com praticamente tudo, mas enfrenta o seu medo como ninguém. Eis a contradição. Coragem, então, é fingir enfrentar um medo ou confrontá-lo, de fato, com todos os receios que o envolvem?
Não sei. Acho até que coragem externa não existe. Ou melhor: ela só existe depois de um longo embate. Pavor é impulso, para trás ou para frente. Coragem também é medo.
Mas e fugir? É uma hipótese válida? Acho que sim. Dar um passo arriscado é um ato de coragem, não? Um passo calculado também. Aceitar que não é capaz (ainda) de vencer um medo especialmente, né? Eis a complexidade do termo. Coragem, portanto, é ter sinceridade consigo mesmo. Ou é o contrário? Coragem para os outros, temor para gente?
Realmente, não dá pra saber. Acho que a bravura cresce com o tempo. Cresce, sobretudo, com a falta dela. Na ausência é que percebemos o exagero.
"Coragem, o cão covarde" foi abandonado quando filhote. Seu tutor, Eustácio, gosta de assustá-lo. Sua tutora, Muriel, o acalanta. A covardia, como se vê, pode ser cultivada. A coragem também.
(...)
Prosa de fim de post:
1 - A cidade fictícia onde "Coragem" mora se chama "Lugar Nenhum".
