Até

Foi no longínquo ano de 2010 que pela primeira vez apertei aqui o botão publicar. Desde então, semanalmente, a tarefa se repetiu com alegria. As opiniões e críticas que embasavam o corpo desse espaço ruíram pouco tempo depois, dando lugar a algo mais sutil, particular e relativo, quando o blog ganhou meu próprio nome.

Nunca achei que fosse durar tanto tempo. Meus escritos jamais tiveram a intenção de apresentar soluções, muito menos sugestões transformadoras. Sempre foram, em suma, retratos pequenos de uma realidade também pequena dos fatos.

Uma década depois, entretanto, é possível observar coerência em todas as criações – até naquelas que já não possuo mais nenhum afeto. A coletânea de quase 300 textos atesta com veracidade a evolução que hoje percebo em meu modo de pensar, de agir e, especialmente, de escrever.

Visualizo também uma delicada transformação interna na maneira de conduzir as coisas – ainda que eu observe também as mesmas dificuldades que encontrava naquele ano. Esse álbum de mudanças jamais se completará, pois a figurinha do aprendizado é rara e se desenvolve ano a ano.

Tornar algo público sempre foi para mim um exercício vaidoso. Eu sempre pensava, pretensiosamente, no que o texto poderia ajudar alguma pessoa. No fim das contas, a história se invertia: quem mais se valia de todo o desabafo textual, era sempre eu mesmo.

Lia e relia várias vezes a criação sempre pensando no que iam pensar de mim. Uma prática egoísta que fazia sentido às vezes. Em poucas oportunidades, recebi o retorno de meus leitores. Me norteava, quase sempre, pelas estatísticas frias da web, que por vezes, acalentava a minha exasperação. Mas eu queria mais, por isso continuei até aqui.

Todo autor tem uma maneira muito singular de apresentar a sua visão de mundo. Todo leitor também. Por isso, encarava com naturalidade as desaprovações que recebia sobre o que eu escrevia. E acho que até hoje isso é uma realidade. Percebo nas leituras que faço de mim mesmo que sou uma pessoa bastante misteriosa às vezes, o que dá margem, é claro, para as pessoas não compreenderem muito bem o meu ponto de vista.

A culpa é sempre minha, eu sei. É que esse jeito meio estranho de falar das coisas, fazendo referências, sendo pouco óbvio, é a maneira mais sincera que encontrei para descrever as coisas que sinto.

Nesse tempo, não tive a capacidade de criar um grupo de leitores, muito menos de cativar nas pessoas uma rotina que me fizesse ter uma audiência fiel. Naturalmente, muitos amigos compartilharam alguns minutos de seus tempos comigo, o que me deixa bastante orgulhoso. Entretanto, a carente indagação é sempre pulsante em meus pensamentos: gostam dos meus textos ou de mim?

Não faz muito sentido, né? Na real, é sempre a mesma coisa. Um misto de criador e criatura com uma pitada de impessoalidade. Sempre me achei também um péssimo divulgador de si mesmo. Pode ser que parte do problema resida aí. Ou, francamente, que a praia da escrita não é o meu ambiente ideal.

Gosto desse afastamento que tenho do ofício. Não me achar um autor de alguma coisa – e receber com desconfiança os elogios carinhosos que ouço por aí – me faz sentir que sou apenas uma pessoa que escolheu a escrita como fuga. Que compreendeu um método antigo que pessoas usam para se inserirem no mundo que as cerca – ou, às vezes, para se colocar à margem. Pois é assim que vejo os meus textos: tentativas de fugir de mim mesmo ou de me encontrar.

Por isso, nesse texto que me parece ser o último desse ciclo, quero, antes de agradecê-los, dizer que estou muito contente de chegar a essa expressiva marca de dez anos. Como disse anteriormente, os números são pouco objetivos em qualquer análise profunda e peculiar das coisas, mas compreendo que é um feito e tanto. Não para as pessoas, mas para mim, né?

Esse é o meu lema: não ter lemas. Por isso, não me levem a sério, nem me descartem. O meu silêncio por aqui é a minha próxima crônica. Valeu!

(...)

Vista do asilo e da Capela de Saint-Rémy. Van Gogh. 1889.

28 set. 20