Enquanto engoma a calça


Solidão povoada
fevereiro de 2016

companhia é sol que queima
luz que teima em iluminar
o quarto escuro e consonante
o tom suave a palpitar

o silêncio que acalanta
faz o barulho nascer
pois as coisas que se dizem
podem pouco valer

(...)


Tenho saudade. Mas sei que a ausência, como lembra Drummond, não é falta, mas, sim, um estar em mim. De longe, sigo emanando boas energias para aqueles que, assim como eu, pensam de maneira otimista a evolução das coisas. Dentro do peito, apenas uma sensação estranha de que a distância também é proximidade.

A canção nos ensinou que ter saudade é bom e que é melhor do que caminhar sozinho. Também acho. Em companhia de minhas inspirações, tenho procurado me conectar com ideias diferentes, com razões dissonantes e com perspectivas que já não fazem parte das minhas concepções. Deixar o barco achar o seu próprio rumo às vezes é bom.

É que o pensamento, você sabe, diverge sobre o próprio roteiro e vez ou outra se perde no ar como um pássaro sem medo, sem lenço e sem documento. Sobre ele, não tenho controle mesmo. Disperso, ele cria seu cronograma e o segue como uma religião.

Penso que em algum lugar deve haver um sonho não realizado esperando alguém que acredite nele, um amor não correspondido esperando uma pessoa que confie nele e, sobretudo, uma luz intensa no túnel nos esperando bem lá no fundo.

É atrás disso que sempre estamos, né?

 (...)

enquanto a saudade aperta
eu vejo de perto
as meias de Humberto

enquanto a saudade sufoca
da minha toca
eu rio com Caetano comendo paçoca

enquanto eu penso na vida
e em sua carga dolorida
eu vejo Gil e sua música perdida

enquanto eu espero o sim
e o encontro, enfim
eu ouço o Moska tocando bem a fim

enquanto eu penso no plano
no sagrado e no profano
eu me deleito com Simoninha e seu piano

ao vivo por um tempo
eu esqueço das mortes
e encaro cantando
a minha própria sorte